quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Precisamos mudar e agora é a hora!

Nos últimos dias tenho ouvido com frequência a pergunta: “Mas você acha mesmo que a inclusão de pessoas com deficiência na escola é possível?” e sempre respondo: “Claro que sim, não sei qual é a dúvida, todos devemos compartilhar os mesmos espaços e experiências, devemos formar alunos que construam um futuro diferente”. Confesso que essa pergunta me causa intenso desconforto e a busca por tentar entender a razão de tal resistência me persegue. A frase seguinte muitas vezes é: “Você acredita que temos professores preparados para receber tais crianças ou mesmo pessoas com formação para capacitar professores para trabalharem com alunos com necessidades especiais?”. Sim, temos, acredito que não em número suficiente ainda, mas se todos acreditarem que é possível, é certo que esse número aumentará.

Por algum tempo esse questionamento me perseguiu e a busca pela resposta também, qual é a dificuldade em aceitar que pessoas com características diferentes daquelas que julgamos normais devem ser incluídas? Ontem, acho que comecei a entender, mas estou engatinhando nessa descoberta. Mas ainda assim, acredito que vale a pena compartilhar com vocês e isso aconteceu enquanto conversava com uma querida amiga, uma das pessoas mais especiais que cruzei na vida, a Dra. Waverli Matarazzo Neuberger, bióloga, professora universitária, uma líder por excelência e que realiza um trabalho magnífico com sustentabilidade.

Ontem, ela contava para mim e para o grupo de pessoas que fazem parte da Agência Ambiental que ela coordena sobre o que ela tem aprendido em um curso de pós-graduação que está fazendo com o professor Dr. Humberto Maturana, de quem sou fã. Ela falava, dentre outras coisas, sobre o que carregamos em nossa vida, sobre conceitos ou pré-conceitos que temos amarrados em nossa essência. Quando observamos objetos ou situações, utilizamos conceitos internos já construídos, tendo, portanto, uma visão limitada daquilo que se apresenta.

É fácil constatar isso. Mostre um copo vazio para um grupo de cinco pessoas e peça para que elas o observem por 10 minutos. Passado o tempo, solicite que cada pessoa descreva as sensações que vivenciaram observando esse copo. Possivelmente, você terá cinco respostas diferentes, e cada resposta está ligada a limitada visão do que para ela é possível.

Em quais conceitos e pré-conceitos estamos amarrados? Quais são os paradigmas que devem ser quebrados? Estamos dispostos a isso, queremos realmente aceitar o fato que pessoas com características diferentes podem compartilhar nossa história? Espero que a resposta seja “claro que sim”, e acredito que essa seja mesmo a resposta correta. Nos últimos anos muitas coisas mudaram, inúmeras delas. Quer um exemplo? Há 16 anos, fui para os Estados Unidos, para Disney especificamente. Quando cheguei ao parque, a primeira coisa que observei foi o número de pessoas com deficiência que circulavam pelos parques e toda a estrutura que estava disponível para elas. E o mesmo se repetia nos supermercados, nos parques, nas lojas, restaurantes e nas ruas. Enquanto isso no Brasil as pessoas com deficiência eram mantidas em casa, seja por falta de infraestrutura urbana para recebê-las, seja pela vergonha (tenho até incomodo em escrever isso) que as famílias tinham, evitando assim sair e mostrá-las ao mundo.

Os aparelhos auditivos eram escondidos por grandes mechas de cabelos e era preferível ficar sem entender o que era dito a confessar que possuía dificuldade em ouvir. Hoje, a realidade mudou, as pessoas com deficiência saíram de casa, estão no mercado de trabalho, moram sozinhas, são capazes de ir e vir sem a assistência de outras pessoas e sim, estão incluídas em salas comuns de ensino. Claro que nada é tão simples como descrevi, para que o mercado de trabalho absorvesse as pessoas com deficiência a Lei de Cotas precisou ser criada. Para que a locomoção urbana aconteça, que o acesso a cultura, esporte, lazer e educação seja real foi necessário que seres humanos brigassem por eles junto ao poder público, assim hoje, já temos acesso a audiodescrição em alguns espetáculos teatrais e em sessões de cinema, a Língua Brasileira de Sinais agora deve ser ministrada em cursos superiores de licenciatura. Igrejas, palestras, salas de aula já contam com intérprete de LIBRAS. Cidades como Socorro, interior de São Paulo, conta com uma infraestrutura completa para atender as pessoas com deficiência, e isso inclui hotéis e restaurantes preparados, instrutores de esportes radicais preparados, mobiliário urbano acessível.
Será que questionar se é possível que pessoas com deficiência frequentem salas de aula comum ainda faz sentido? Acho que não...

Esse artigo foi publicado pela Erika Longone no site http://www.vidamaislivre.com.br/